Por Barry Fingal Floyd

Se eu entro no MSN, chove nego me perguntando como tá a crise, todo mundo quer saber de emprego e cada um tem uma piadinha para minha capacidade ladina perante o dinheiro irlandês. Mas crise é um trem que eu acho engraçado ou então o trem é sério e eu nunca vivi uma de perto para poder dizer que de fato a Irlanda está passando por uma. Oras, crise… eu vou no centro e tá toda aquela irlandesada branquela com cabelo de fogo carregando sacola de tudo quanto é loja, é bem verdade que a maioria são da Penneys – uma equivalente da C&A por aqui – esses dias vi um jogo de rugby e o estádio estava lotado, pow e os ingressos mais baratos são 80 euros, por isso eu não fui, mas a galera da crise estava toda lá.
A pior crise irlandesa é o clima, ele está passando por um momento difícil, se durante três dias fazem sol, os próximos três são totalmente imprevisíveis, de chuva a nevasca, tsunami a furacão, tem de tudo. Nas palavras de thiaguinho, musicista brasileiro, linha de frente do exalta isso aqui “táááá um caaaaaus”. Acho que economicamente a Irlanda tá igual seu próprio clima, hora chove – na outra também – depois seca, bate uma ventania e ninguém sabe o que realmente está acontecendo.
Mas aqui tem crise demais, na última semana mesmo fui atacado por uma delas. Minha garganta dói, sabe aquela tosse seca que levanta o catarro? Tira da garganta, mistura com o da narina joga na língua. Já fiz de tudo para conter a crise, banho quente, beber água quente, própolis, extrato e até um remédio que eu trouxe do Brasil eu já usei, mas nem deu nada, bula? Pra que? Tomei um paracetamol também… ou dois… e tem um chá, horrível que eu encarei e só ficou bom com dois dedos de leite.
E se tem crise tem menina crisenta, tem gente que não quer molhar o pé, mas veio para a Irlanda em outubro, quando supostamente começa a temporada de chuva. Tem que chegou fazem duas semanas e já tá querendo ir embora, mudar de cidade, fugir da raia. Pergunto por que? Porque não arrumou emprego, peraí, vão fazer dois meses que eu to aqui e o mais próximo de um emprego que eu tenho é lavar a louça um ou dois dias na semana e eu nem to recebendo por isso. Mas e o tal do emprego? Tá difícil? Tá? Num sei, sinceramente eu nem comecei a me matar de procurar emprego, lancei uns curriculuzinhos no mercado, de leve para sondar o local, mas eu ainda não sai andando por todas as ruas da cidade distribuindo papel. Bom Vivant? Não! Folgado? Não! Tem respaldo do papai? Bem queria, mas é só uma questão de estilo, cada um tem o seu.
Falando em lavar louça, tem a crise das tarefas domésticas. Eu não gosto de tabela, detesto ver meu nome cravado na terça-feira escalado para lavar o banheiro. O problema não é lavar o banheiro, o problema é quando a sua obrigação se torna a cobrança dos outros. Se na escala consta meu nome eu vou lá e faço e se eu tenho que fazer na terça-feira, na terça estará pronto. O problema é que a terça tem 24 horas meu querido e como eu não durmo nem quatro horas, provavelmente quando eu decidir fazer a arrumação, alguém correu e fez na minha frente. Não, não é questão de ser folgado, antes que venham me acusar. Ok, eu entendo que tem gente que não gosta de ver a pia cheia de vasilha, entendo perfeitamente, mas se eu levanto as sete horas da manhã e no lugar do bom dia eu ganho cara fechada e “você não vai lavar esses copos?” eu mando tomar no olho do cu. Me deixa morder o pão, Tenente Rocha disse: “Cada cachorro que lamba sua caceta” , se você não suporta ver três xícaras na pia, ou você lava ou você espera eu tomar meu café para fazer tarefa doméstica.
Tem a crise de identidade. Você acorda e tá na Irlanda, aí você vai ao supermercado e tá todo mundo falando português, você entra no MSN e sua mãe te da sermão, briga com você e te faz mostrar os dentes na webcam para ver se estão bem escovados. Uai, onde que eu to e quem sou eu? Amigo vira família, família vira amigo, patrão vira cuzão, argentina fica gente boa e a Polônia tá tão de ponta cabeça quanto Irlanda, Portugal e Grécia (Essa nem conta, vender ilha para pagar a dívida é novidade para mim).
Se eu for descrever todas as crises, vou acabar gerando um colapso na cabeça dos amigos. A verdade é que se a Globo e a veja tão mentindo outra vez eu não sei, mas ainda não senti a tal crise irlandesa que parece estar batendo em tudo por aqui. Se me acertar eu provavelmente vou cair, mas a nossa esperança é que o Brian Cowen (Vulgo BIFFO – Big Ignorant Fucker From Offaly*) pegue o empréstimo da União Européia e continue sustentando os irish desempregado, aí sobra mais sub-empregos para nós.
*Um dos 26 estados que formam a República da Irlanda.